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À medida que empresas ao redor do mundo intensificam o uso de tecnologias de inteligência artificial (IA) para otimizar processos e elevar a produtividade, estudos indicam que os efeitos no mercado de trabalho serão expressivos — inclusive no Brasil. Segundo a consultoria LCA 4Intelligence, cerca de 31,3 milhões de postos de trabalho no país serão impactados, sendo 5,5 milhões potencialmente suscetíveis à automação total.
O Relatório do Futuro do Trabalho 2025, publicado pelo Fórum Econômico Mundial, aponta que 41% dos empregadores pretendem reduzir o número de funcionários com a implementação da IA. Pela primeira vez, os chamados white collar jobs — funções administrativas, financeiras e jurídicas — passam a figurar entre os mais vulneráveis à substituição, superando até mesmo ocupações operacionais.
Em entrevista à Axios, Dario Amodei, CEO da Anthropic, defendeu que a substituição massiva de trabalhadores de nível básico em setores como tecnologia, finanças e consultoria é iminente. Ele reforça que o discurso suavizado sobre os impactos da IA precisa ser revisto, já que “qualquer gestor, diante da possibilidade de redução de custos, irá considerar a automação como alternativa viável”.
A velocidade das transformações é uma das principais preocupações. Como observa a pesquisadora Andrea Janér, fundadora da Oxygen, "não se trata de uma revolução industrial tradicional que leva décadas — as mudanças atuais ocorrem em questão de meses".
Nos Estados Unidos, os empregos de entrada, como estágios e programas de trainee, estão entre os mais atingidos. Aneesh Raman, diretor de oportunidades econômicas do LinkedIn, observou no The New York Times que a IA está eliminando "os primeiros degraus da escada profissional".
Apesar da tendência global, não há evidências de uma substituição em massa no Brasil no curto prazo, segundo Leonardo Melo Lins, coordenador da pesquisa TIC Empresas, do Cetic.br. A baixa adesão à IA no país — apenas 13% das empresas adotaram essas tecnologias em 2024 — pode proporcionar uma janela maior para adaptação e capacitação dos profissionais.
Ainda assim, jovens e profissionais em início de carreira apresentam maior vulnerabilidade, uma vez que a IA, com amplo repertório de dados, tende a superar a performance de quem está em fase de aprendizado prático.
O levantamento também aponta que a adoção da IA é mais expressiva em grandes empresas e no setor de tecnologia da informação e comunicação (TIC), ambos com índice de 38% de utilização.
Andrea Janér destaca que áreas outrora consideradas promissoras, como engenharia e ciência de dados, também passaram a sofrer impactos, citando recentes cortes em empresas como a Microsoft.
Para Adriano Carezzato, professor da FIA e da Fundação Vanzolini, a revolução promovida pela IA tende a ser tão transformadora quanto a chegada da internet. No entanto, a velocidade com que ocorrem as mudanças pode excluir parte da população das decisões econômicas e sociais, agravando desigualdades.
A adoção desordenada da IA pode ampliar a lacuna entre setores com maior e menor produtividade, afetando principalmente empregos de renda média e baixa. Para evitar esse cenário, será essencial aplicar a IA também em setores não comercializáveis e fomentar modelos colaborativos entre humanos e máquinas, em vez de meramente substitutivos.
Sam Altman, CEO da OpenAI, e outros líderes do setor — como Elon Musk e Bill Gates — já manifestaram publicamente que a IA poderá assumir a maioria das atividades humanas nas próximas décadas. Nesse cenário, modelos como a Renda Básica Universal voltam a ganhar força como solução para sustentar economicamente populações impactadas pela perda de empregos.
“Hoje, a vida em sociedade gira em torno do trabalho. Essa lógica pode não fazer mais sentido em um futuro automatizado”, reflete Janér. A afirmação encontra eco em Amodei, da Anthropic, que ressalta: “Se a criação de valor econômico deixar de estar nas mãos do cidadão médio, a estabilidade das democracias poderá ser colocada em risco”.
Para mitigar os impactos negativos da IA sobre o mercado de trabalho, especialistas defendem:
Conscientização da sociedade sobre os impactos da automação;
Investimento massivo em requalificação profissional, com apoio da própria IA;
Políticas públicas adaptadas a uma nova lógica econômica, mais inclusiva e distributiva.
Leonardo Lins conclui que, apesar dos riscos, o Brasil dispõe de avanços institucionais e sociais que podem guiar a formulação de novas regras mais justas. O desafio está em antecipar as mudanças e construir uma transição que priorize a dignidade e a inclusão social em um cenário cada vez mais moldado pela inteligência artificial.